Por Heraldo Palmeira
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21 de novembro de 2024

Leno que eu conheci

Arquivo/Reprodução

Leno que eu conheci

  • João Galvão Neto

Os últimos dois meses deste ano de 2022 foram duros para aqueles que acompanham a boa música no Brasil e no mundo. Em 9 de novembro, Gal Costa nos deixou ainda em plena produção artística. Em 22 de novembro, Pablo Milanés e Erasmo Carlos nos deixaram. O cantor e compositor cubano Milanés morreu na Espanha, abrindo um vazio na composição cubana de qualidade. No Brasil, Erasmo Carlos morreu e deixou órfã uma geração de roqueiros que viam nele um dos precursores do rock and roll brasileiros vindo da era pré-Beatles e paralela aos Fab Four. Ele era fã de Elvis (como também Raul Seixas), logo, roqueiro, ainda que tenha produzido inúmeros clássicos da canção romântica brasileira em parceria com Roberto Carlos.

Nossa Música Potiguar Brasileira, MPotB, no dia 11 de novembro, perdeu o publicitário e ex-baixista da banda natalense Impacto Cinco Idalmi Oliveira. Idalmi era pernambucano, mas radicado na música natalense por muitos anos. O dia 8 de dezembro tem sido lembrado mundialmente pela morte de John Lennon, assassinado em Nova Iorque, em 1980, e pela morte, também na mesma cidade, do nosso maestro soberano Tom Jobim, em 1994. Neste último 8 de dezembro, fomos surpreendidos com a morte de Leno – Gileno Osório Wanderley de Azevedo, mais conhecido nacionalmente por sua participação na dupla da jovem guarda Leno e Lilian.

Eu conheci Leno através de Etelvino, do Impacto Cinco – banda de baile importante na música do Rio Grande do Norte. Leno costumava se encontrar com Etelvino, muitas vezes nos ensaios da banda quando vinha a Natal, e fomos apresentados. Ele já era um nome nacional da jovem guarda, cantando em dupla com Lilian, que era namorada de Renato Barros (guitarrista líder de Renato e seus Blue Caps, banda mais antiga do que os Rolling Stones, ainda em atividade). Renato sugeriu que Leno formasse a dupla, uma vez que não havia na jovem guarda uma dupla cantor-cantora, e já havia duas duplas de cantores – Os Vips e Deny & Dino. Isso feito, gravaram um compacto simples – os mais velhos entenderão o que significa –, com as músicas Pobre Menina (versão de Leno para Hang on Sloopy) e Devolva-me, de Renato Barros, que foi gravada há poucos anos por Adriana Calcanhoto.

Leno teve, ainda tem, uma história importante na música potiguar, principalmente no segmento rock and roll. Criou uma banda em Natal, The Shouters, tocando rock, e foi apresentador/narrador do programa Rock Concert, dedicado ao rock moderno, na Rede Globo de Televisão de março de 1977 a setembro de 1978. Sua praia sempre foi o rock.

Quando passou a produzir artistas na CBS, sua gravadora à época, Leno veio a Natal e produziu dois discos do Impacto Cinco, um dos quais, Lágrimas Azuis, é um dos discos mais procurados no rock brasileiro, um verdadeiro clássico. Quando Leno passou a produzir discos na RCA, transformou parte do Impacto Cinco no Flor de Cactus (RN), com uma nova proposta modernizando a música nordestina. Três pérolas em forma de discos foram produzidas: Flor de Cactus (1980), Pepitas de Fogo (1981) e Alicerce da Terra (1982). Estão na internet, vale garimpar – atenção para o fato de que existem diversos outros grupos com o mesmo nome.

Se alguém há de indagar se Leno se sentia comprometido com a música potiguar, basta lembrar sua declaração de amor a Natal gravada em compacto simples, em 1970, É Bom Estar em Natal Mais Uma Vez, suas produções de discos já mencionadas e o espaço a compositores potiguares que ele deu em seus discos solos. Basta ouvir, por exemplo, o álbum Encontros no Tempo (1981). Não consigo me lembrar de outros artistas potiguares que gravaram compositores norte-rio-grandenses, a não ser em parceria. Leno abriu espaço em seus discos para canção potiguar. Quando ele lançou discos solos e pôde, enfim, lançar Vida e Obra de Johnny McCartney, em 1995, que fora proibido quando foi gravado, entre 1970 e 1971; Aquelas canções-Antologia 1968/1970, em 1995; e O melhor de Leno (1974-1988), em 1998, ele criou um selo para publicação chamado Natal Records. Natal sempre foi seu porto seguro e ele decidiu voltar a viver, produzir e compor aqui.

Ele costumava me chamar “John Gavin” (Gueivan) e eu o chamava “Gil Lemos”. Era como nos comunicávamos nos papos telefônicos. Alguns amigos músicos o chamavam Tio Leno, o percussionista Mingo Araújo, por exemplo. Conversamos há dois meses, eu já sabia da batalha que ele estava travando, mas não falamos sobre isso. A ele cabia definir o assunto, mais uma vez ele me pediu uma cópia de uma foto que tenho de Natal, feita por meu filho Gabriel, que ele viu em minha casa e se apaixonou por ela. Nela aparecia seu prédio e ele quase podia ver seu apartamento. Ele sempre foi gentil comigo e eu retribuí com a mesma gentileza. Ainda lembro sua voz suave conversando sobre música ou cantando. Há alguns anos, fizemos uma noite de cantoria na despedida de Enoch Domingos, parceiro comum, que viajou para a Austrália. Cantamos as canções sem amarras de repertório, carimbando nas nossas almas um momento a ser lembrado. Descanse em paz, que Deus o receba no grande coral.

*JOÃO GALVÃO NETO, professor de línguas e compositor, beatlemaníaco, como Leno

Saiba mais

Rock Concert   http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/0%2C27723%2CGYN0-5273-257659%2C00.html

Entrevista à TCM   https://luciazanetti.wordpress.com/2012/09/14/a-historia-musical-do-cantor-leno

Entrevista, no Hotel Thermas, Mossoró, Rio Grande do Norte, em novembro de 2011, Leno conta sua trajetória musical. Na segunda parte, ele fala da produção de artistas potiguares. (1:15’ a 2:15’)

Parte 2: https://youtu.be/JOkF8vGgroo

Sucessos com Lilian   https://youtu.be/cOdJnsbt_u4

Olá, Billy Boy – Encontros no Tempo   https://www.youtube.com/watch?v=hRg03sB1New

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