Divulgação/CBF
Dinamite neles!
- Sylvio Maestrelli
Muita gente não teve a oportunidade de ver Roberto Dinamite jogar. Mas a turma dos anos 1990 viu Gary Lineker. A dos anos 2000 viu Hernán Crespo. A mais recente viu Robert Lewandowski. Pronto. Somem as qualidades deles todos e verão a imagem de Dinamite em campo, seja com a gloriosa camisa do Vasco da Gama, onde está eternizado em estátua dentro do estádio do clube, seja com o manto do Escrete Canarinho, pelo qual esteve presente em duas Copas do Mundo, 1978 e 1982, infelizmente só a primeira como titular.
O menino Roberto tornou-se Dinamite, popular sobrenome que o acompanhou em razão do chute fortíssimo que tinha desde a época de juvenil. Mas não era apenas um centroavante matador, aquele que se posicionava com eficiência à espreita de um passe ou alguma sobra na área, como o fenomenal Gerd Müller ou o oportunista Paolo Rossi. Sabia tabelar, ao estilo de Romário, Vavá, Ademir de Menezes ou Tostão, todos ex vascaínos. Batia faltas e pênaltis como poucos, com frieza e maestria absurdas. E, no decorrer de sua carreira, foi-se reinventando, passando a atuar quase como um meia garçom servindo centroavantes. Como comparação, basta lembrar do ótimo Evair, compondo o ataque com Edmundo no próprio Vasco, na sensacional dupla do fim dos anos 1990.
Idolatrado pela torcida cruzmaltina, Roberto Dinamite era um jogador tão simpático, sorridente, afável, que mesmo os torcedores adversários o aplaudiam. Sou testemunha ocular disso, no Maracanã. Destaque do time da Colina, ele havia sido vendido ao Barcelona no início de 1980. Lá, depois de raras oportunidades, foi sacaneado pelo veterano técnico Helenio Herrera e, numa jogada de mestre do controverso dirigente Eurico Miranda, retornou ao Vasco vencendo a concorrência do Flamengo, que sonhava com a dupla Roberto-Zico! E a reestreia em grande estilo foi justamente contra o meu Timão, o Corinthians, pelo Brasileirão.
Lembro como se fosse hoje que os paulistas abriram o placar com um raro gol do Caçapava. Mas a alegria durou pouco: Dinamite fez o que quis naquele jogo, enfileirou 4 gols no Timão só no primeiro tempo. E guardou mais um no segundo, depois de Sócrates ter diminuído o placar. Ao fim da partida, 5×2, 5 gols dele. A Fiel Torcida, perplexa, aplaudiu respeitosamente seu algoz.
Roberto Dinamite vestiu a camisa do Vasco 1.110 vezes – recorde absoluto. Como colocava bolas nas redes adversárias a granel, até hoje é o maior goleador do Brasileirão (190 gols), do Campeonato Carioca (284) e do glorioso Vasco da Gama (708 gols), à frente de lendas do clube como Romário, Edmundo, Vavá e Ademir de Menezes. Foi também o principal jogador na primeira conquista de um Brasileirão pelo alvinegro da Colina, em 1974, diante do então poderoso Cruzeiro.
Na Seleção também se destacou, especialmente na copa de 1978, na Argentina, quando não apenas fez o gol do magro 1×0 contra a forte Áustria, que nos classificou para a segunda fase, quanto outros dois contra a Polônia, que nos teriam dado o direito de disputar a final, caso os argentinos não tivessem goleado os peruanos horas depois. E em 1982, muitos torcedores lamentarem Telê ter escalado o limitado Serginho como centroavante titular naquela seleção brilhante de Zico, Falcão, Sócrates e Júnior. Argumentam até hoje, indignados, que Dinamite teria sido artilheiro daquele Mundial da Espanha, jogando junto com aquelas feras todas. Havia até quem o considerasse mais eficaz que Careca e Reinaldo, craques de bola, ambos de fora por contusões.
Infelizmente, para todos nós, amantes do bom futebol – e da fidelização dos craques a seus times de coração –, Papai do Céu chamou Roberto Dinamite ainda novo, aos 68 anos, para reforçar mais o timaço celestial e dar a oportunidade de ele jogar junto (obviamente com qualquer camisa, menos a 10) com o Rei Pelé. Restou-nos o luto porque o futebol brasileiro perdeu mais uma de suas eternas estrelas e uma figura humana reconhecida pela bondade e pela enorme capacidade de fazer amigos, inclusive entre os principais rivais – basta lembrar da sua relação com Zico, com quem costumava trocar carinhosamente as camisas do jogo nas grandes decisões.
A alcunha “Gigante da Colina” hoje tanto é do Vasco da Gama quanto de Roberto Dinamite, seu ídolo maior. Pelo menos na memória afetiva da torcida será possível reviver em São Januário, Maracanã e outros templos do nosso futebol o grito “Dinamite neles!”. Aquilo era festa para os vascaínos e desespero para qualquer adversário.