Por Heraldo Palmeira
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7 de novembro de 2024

KALUNGA MELLO NEVES Uma nova torre de Babel

Ziv Qual/Reprodução da internet

Uma nova torre de Babel

  • Kalunga Mello Neves

Estão sentados ao redor da mesma mesa. São pessoas que aparentemente nada têm a ver umas com as outras. Discutem com propriedade sobre determinado assunto procurando de forma convincente e persuasiva impor sua opinião. O que se pode observar é o surgimento em forma de diálogo inconsequente de uma nova torre de Babel.

Nesta mesa estão um psicólogo casado, um homossexual não assumido, uma divorciada rancorosa, uma ex-freira – talvez fosse descolada demais para uma vida reclusa –, um deputado espírita. Todos ali ao redor da mesa, representando cada, um pouco de todos nós. Com nossas divergências, nossas concordâncias, nossas indecisões momentâneas, mutantes que somos.

Se conhecem como aquele e aquela. Em comum, o gosto pela noite e suas viagens verbais alucinógenas e metafóricas. Bebem cerveja apenas, várias, mas apenas. Se conhecem apenas como aquele e aquela, nem amigos são.

Sabem e entendem de tudo e de todos os assuntos. Ultrapassam os limites de suas realidades e conhecimento. Arriscam-se ousadamente acreditando no que dizem, sem necessidade de escutarem-se, quanto mais querendo que alguém os ouça – interessa falar.

Falam ao mesmo tempo desordenadamente, impulsivamente, neuroticamente. A verdade fica ruborizada com tamanha superficialidade. A razão esconde-se entre as azeitonas, vermelhas de vergonha – por sorte são pretas as azeitonas servidas e, com a meia-luz daquela estridência, o rubor da verdade e da razão consegue ficar menos visível, menos desconfortável. E é solicitada mais uma cerveja.

Na mesa ao lado, a família reunida comemora algum aniversário. Sorriem, vez que outra falam alto, mas não desgrudam de seus celulares. Mas, aí já é outro assunto.

*KALUNGA MELLO NEVES, escritor e brincante

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