Por Heraldo Palmeira
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23 de novembro de 2024

KALUNGA MELLO NEVES Coisa pra se guardar

Steve Buissinne/Pixabay

Coisa pra se guardar

  • Kalunga Mello Neves

Nas idas e vindas do meu pensamento, uma ode à amizade! Foi assim, sem mais nem menos. De repente. Tarde qualquer, eu pela rua, olhando gentes sem me deter nos rostos. Reclamando para mim mesmo, ranzinza como sempre, de alguma transgressão cometida por alguém diante dos meus olhos, críticos e raivosos, sem motivo algum para tal. Que me interessa se o cara de terno cinza fala ao celular enquanto dirige? O que eu tenho que me importar com a louraça de cabelos recém tratados que acabou de destratar a vendedora na loja de roupas finas? Tenho mesmo é que seguir meu rumo, comprar pão, me cuidar ao atravessar a rua.

Mas, entre idas e vindas a me desentender com minhas divagações, uma menina me interrompe, microfone na mão, o rapaz com a câmera atrás dela. Posso lhe fazer uma pergunta? Faça, respondo gentil. Amanhã é o Dia do Amigo. O que você acha da amizade hoje em dia?

Justamente naquele momento aquela pergunta! A amizade para mim é explicada através de gestos e ações guiados pelo coração. Por mais que as palavras a definam, é o coração que silenciosamente nos conduz para a companhia das pessoas que nos serão eternas. O coração servirá de ponte para encurtar distâncias, voará espaços infinitos como pombo-correio infatigável para entregar uma mensagem de carinho ao amigo que não podemos abraçar pessoalmente. O coração nos explicará que de um amigo a gente gosta simplesmente, que um amigo a gente admira até quando momentaneamente estivermos em lados opostos. Para um amigo sempre a gente está ali onde ele pode nos enxergar com olhos de cumplicidade.

Ela me perguntou se eu tinha muitos amigos. Muitos não, mas bons, eu respondi. E lembrei-me de todos eles naquele momento. Ela ali esperando a continuação da minha resposta. Eu os vendo alegremente em meio ao movimento dos carros na avenida, correndo para me reencontrar com a saudade de sempre. Que boas lembranças você me fez sentir agora menina, eu falei. Lembra de algum amigo em especial?, ela voltou a perguntar.

Falei o nome de um deles. Poderia ter citado um outro. Sei que não iriam se importar, pois especiais meus amigos todos são, e meu coração sabe bem disso. A menina agradeceu minha disponibilidade para atendê-la e seguiu adiante para entrevistar mais pessoas. O meu caminho ficou mais leve depois daquela oportunidade que tive de relembrar pessoas que marcaram tanto minha vida.

Segui adiante. Sem me importar mais com o que não me dizia respeito. Cantarolando, com a leveza de quem está de bem com a vida, uma canção antiga e sempre atual do Milton Nascimento.

“Amigo é coisa pra se guardar no lado esquerdo do peito”.

*KALUNGA MELLO NEVES, escritor e brincante

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