Por Heraldo Palmeira
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22 de novembro de 2024

HAYTON ROCHA Conversando com estrelas

Djavan e Ruy Castro/Reprodução/Blog do Hayton/Redes sociais

Conversando com estrelas

  • Hayton Rocha

Tive a sorte de poder bater papo por 15 ou 20 minutos com alguns personagens da nossa história contemporânea. Isso, claro, por conta de algumas funções que exerci durante mais de 40 anos numa grande empresa brasileira.

A lista é boa e vai do universo artístico-cultural (Altamiro Carrilho, Armando Nogueira, Capiba, Carlinhos Brown, Daniela Mercury, Dona Canô, Gilberto Gil, Herbert Vianna, Ivete Sangalo, Jaguar, Jessier Quirino, João Barone, João Carlos Martins, Lulu Santos, Maria Gadu, Roberto Carlos, Samuel Rosa, Zeca Baleiro e Ziraldo), passa pelo campo esportivo (Bernardinho, Buglê, Cafu, Carlos Alberto Torres, Clodoaldo, Guga, Nalbert, Pelé, Roberto Dinamite, Tande, Zé Roberto Guimarães e Virna), até a classe política (ACM, Marco Maciel e Miguel Arraes).

Conversas que me renderam alguns textos publicados. Escritores cascudos, reconheço, produziriam coisas mais interessantes, mas não tiveram o privilégio de assistir (de camarote!) aos fatos, ainda por cima recebendo salários e benefícios rigorosamente em dia.

Eu deveria me dar por satisfeito com aquilo que o acaso me reservou de ganhos indiretos, mas é natural querer um pouco mais. E andei pensando sobre quem poderia ter conhecido e não tive oportunidade. Tarde demais? Nunca se sabe.

Volto à adolescência, no início da década de 1970. Naquela época, destacava-se em Alagoas o “conjunto” LSD – Luz, Som & Dimensão, sob a batuta de um cantor e guitarrista que embalava as noites mornas de sexta-feira, na AABB Maceió, com os hits do momento.

Antes que Djavan (foto) despontasse com seu primeiro álbum A Voz, o Violão, a Música de Djavan (lançado em 1976, o disco trouxe canções como Flor de Lis e Fato Consumado), vacilei e perdi a chance de conhecê-lo. Era acanhado demais para puxar conversa com o ex-armador do juvenil do CSA, que jogava ao lado de meu amigo Zabelê.

Bem mais adiante, se já me conhecesse, não seria tarefa tão complicada perguntá-lo em que praia andou catando palavras tão simples para tecer sofisticadas construções poéticas como:

“…Só eu sei as esquinas por que passei… Sabe lá o que é não ter e ter que ter pra dar?” (Esquinas).

“…Vou andar, vou voar, pra ver o mundo. Nem que eu bebesse o mar encheria o que eu tenho de fundo.” (Seduzir).

“…Um dia triste, toda fragilidade incide. E o pensamento lá em você, e tudo me divide.” (Nem Um Dia).

“…Viver é todo sacrifício feito em seu nome […] Por ser exato, o amor não cabe em si. Por ser encantado, o amor revela-se. Por ser amor, invade e fim.” (Pétala).

Outro que eu gostaria de conhecer é o escritor e jornalista Ruy Castro (foto). Autor de vários livros, entre eles biografias essenciais (Estrela Solitária – Um brasileiro chamado Garrincha; O Anjo Pornográfico, sobre Nelson Rodrigues; e, Carmen, sobre Carman Miranda), esbanja ao mesmo tempo um estilo leve e duro, mordaz e sutil, em textos bem-humorados sobre comportamento, futebol, política e história, que me fazem refletir e rir. Muito.

Todas as vezes em que me meto a escrever, penso no que me diria se estivesse a meu lado. Quem sabe me daria dicas cruciais, até mesmo para não brincar com coisa séria, pôr um ponto final no que ando fazendo e desistir de minhas exclamações, interrogações, reticências e vírgulas nada essenciais.

Dois caciques em suas respectivas tribos. Posso até imaginar que Djavan, no fundo, esconde uma alma vascaína, da mesma fonte de energia de onde emanou Paulinho da Viola e Aldir Blanc. Ruy Castro também. Poderia, aliás, escrever a versão definitiva da linda e inclusiva história do Vasco, com as tintas de sua paixão pelo social.

No campo político, gostaria de conhecer alguém que defenda uma tese bastante simples com a qual eu e você, leitor, nos identificamos totalmente.

Quando uma criatura eleita esquecesse dos compromissos de campanha, o eleitor poderia revogar seu próprio voto (exercício do direito de arrependimento), anulando-o, via internet, no site do TSE. E se, em até 120 dias da posse, um razoável conjunto de decepcionados fizesse a mesma coisa, a figura perderia o mandato.

Sabe-se que eleições existem também para remissão de pecados, isto é, ninguém se obriga a votar de novo em quem desonra compromissos. Mas por aqui essa lógica nunca funciona. A memória é curta e fugaz.

Uma vez no picadeiro, sob os holofotes, o palhaço ri da plateia e se reelege sucessivas vezes, submetendo-se, se tanto, à habitual dança de poltronas entre cargos legislativos e executivos, federais, estaduais ou municipais.

Acontece que a criatura que gostaria de conhecer ainda não veio ao mundo. E nem sei se vai nascer, crescer e arejar o cenário político, antes que o país ingresse de vez com um pedido de recuperação de múltiplos órgãos perante o Juízo Final, sem muita chance de sucesso.

Tarde demais? Nunca se sabe. Mas, enfim, não estou proibido de sonhar. Até os mortos, imagino, sonham que a vida continua.

*Hayton Rocha, escritor e blogueiro

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