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Vai uma IA aí?
- Heraldo Palmeira
O ano de 2023 chegou colocando a Inteligência Artificial (IA) em todas as vitrines do que costumamos enxergar como o futuro. Uma consequência natural da corrida que as big techs – pela ordem de valor de mercado temos Apple, Amazon, Alphabet (Google), Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp), Microsoft e Tesla – empreendem pela liderança do mercado global das ferramentas dessa tecnologia.
Essas corporações gigantes e globais precisam encontrar sequência para seus negócios, dar o passo seguinte em direção à própria continuidade. Ainda mais quando está nas planilhas financeiras do mercado a desvalorização de US$ 3,9 trilhões (R$ 20,3 trilhões) que as cinco primeiras dessas empresas, também conhecidas como five techs, sofreram no decorrer de 2022 em razão da alta na inflação dos EUA e da queda das vendas para os patamares pré-pandemia. Ou seja, investir diuturnamente em novidades parece a saída natural.
A IA está presente há bastante tempo no mundo corporativo, trazendo benefícios para diversas áreas de negócios. Hoje, predominam três categorias de chatbots: comércio, conteúdo e atendimento ao cliente. A grande questão é que robôs são alheios a cansaço, horário de trabalho, dias úteis, fins de semana, feriados, datas especiais e, consequentemente, direitos trabalhistas. Não reclamam de tarefas simples e repetitivas e ouvem reclamações sem perder a linha, num ambiente de relacionamento onde clientes costumam descarregar sua irritação. Para as empresas, nada melhor do contar com “alguém” que não sofrerá qualquer alteração de humor que possa piorar o atendimento, e apenas segue uma programação.
Além de reduzir substancialmente o número de empregados para as mesmas tarefas, os robôs permitem às empresas oferecerem bens e serviços 24×7, com aumento da satisfação dos clientes e da valorização da marca. Ao mesmo tempo, as tecnologias promovem enorme geração de dados para amparar ações de marketing e promoções comerciais muito mais customizadas com os interesses dos consumidores.
A parte mais visível são os chatbots dedicados a pesquisas, assistência virtual e conversas. Sua presença no cotidiano se dá por meio de bancos, delivery, recursos humanos, saúde, setor automotivo e turismo. Os chatbots fazem parte de um conjunto de tecnologias desenvolvidos para que pessoas e empresas possam realizar trabalhos repetitivos com mais eficiência.
Neste início de ano a mídia foi inundada com o termo ChatGPT, como se ele traduzisse a nova panaceia sem a qual o mundo não conseguirá sobreviver doravante. Sem negar virtudes à ferramenta, está óbvio que há uma grande ação comercial por trás dessa “invasão” mercadológica da versão ChatGPT-3 – a próxima geração, ChatGPT-4, está a caminho e promete oferecer resultados ainda mais apurados.
GPT é a sigla de Generative Pre-trained Transformer, que significa algo como Transformador Pré-treinado Generativo em tradução livre. A ideia original de sua criação: aprimorar os recursos e as experiências oferecidas pelo Google Assistente e Alexa, oferecendo uma forma simples de conversar e ter respostas. Sua arquitetura está baseada na rede neural Transformer, desenhada para trabalhar com textos e capaz de construir respostas considerando diversas palavras-chave. É a partir dessa capacidade que a ferramenta cria textos tradicionais e consegue surpreender ao elaborar textos literários, músicas, receitas e programação computacional a partir das demandas dos usuários.
O GPT foi criado pelo OpenAI, laboratório destinado a conduzir pesquisas e desenvolver tecnologia amigável no campo da inteligência artificial. A fundação ocorreu no fim de 2015 em São Francisco (EUA) por diversas figuras do mundo da tecnologia, dentre elas Elon Musk, Jessica Livingston, Peter Thiel, Reid Hoffman e Sam Altman. A Microsoft também participa do projeto com investimento de US$ 11 bilhões (R$ 57,3 bilhões).
No estágio atual, essa tecnologia tem mostrado grande impacto nas comunicações empresariais, com especial utilidade no atendimento ao cliente, mas os pesquisadores entendem que os assistentes virtuais avançarão sobre diversos outros setores. Sob o ponto de vista de eficiência, sua utilização também automatiza boa parte dos serviços, agiliza processos, elimina trabalho humano, reduz custos e promove melhora organizacional da empresa.
Diversos sistemas produtivos já vêm substituindo homens por máquinas. A indústria automobilística e o turismo são exemplos imediatos. Há décadas, as montadoras têm pouquíssimas pessoas no chão de fábrica e restam raros modelos de alta exclusividade ainda fabricados à mão. Viajar tornou-se algo simplificado e muita gente já comprou passagens aéreas (fez check-in, marcou assentos), hospedagem, mobilidade, comida (reservas em restaurantes ou delivery) e tickets de entretenimento de forma automatizada.
A literatura e o cinema transformaram a IA em tema principal ou personagem de diversas obras, facilitando a aproximação do mundo virtual com a realidade. O imaginário e o tom de humanização trazidos por alguns livros e filmes nos levaram a uma espécie de estimulação mental divertida, que facilitou nossas conversas com esses seres digitais.
Apresentado como a última novidade tecnológica que alcança o mundo inteiro de forma uniforme, o ChatGPT já tem versão em português. Entretanto, diante da quantidade de acessos registrada, o sistema tem enfrentado as instabilidades comuns a esses estágios iniciais de instalação.
História Desde que a tecnologia alcançou determinado ponto de desenvolvimento, o homem passou a buscar um patamar em que robôs pudessem pensar e agir como os seres humanos.
Ao contrário do que parece, os assistentes virtuais foram desenvolvidos bem antes do que imaginamos. A primeira menção a esse tipo de tecnologia está em Eu Robô (1950), um dos maiores clássicos da literatura de ficção científica, escrito pelo escritor russo-americano Isaac Asimov, eterno apaixonado pelos robôs – o filme (lançado em 2004) usou o livro apenas como base para o roteiro e é bem diferente, pois o texto original é composto por um conjunto de nove contos sobre a evolução dessas máquinas através do tempo. A leitura de Asimov é um marco original que levou o assunto para muitas obras de escritores e cineastas, e conquistou uma legião de interessados ao redor do mundo.
Naquele mesmo ano de 1950 a jornada começou de verdade, a partir do momento que o cientista e matemático britânico Alan Turing, conhecido como “pai da computação”, definiu inteligência artificial. Para ele, “se um computador puder dialogar com um humano por meio de um chat, sem que a pessoa perceba que está conversando com uma máquina, o computador em questão pode ser considerado ‘inteligente’”. Em homenagem a ele, a avaliação para comprovar essa capacidade foi denominada Teste de Turing, que segue operante em sites e dispositivos modernos como meio de promover segurança para os usuários.
Somente em 1966 o conceito virou realidade, quando o cientista e escritor teuto-americano Joseph Weizenbaum, pesquisador do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) criou o software Eliza. Considerada a mãe de todos os bots, foi criada para simular uma psicóloga. Começou aí, em termos práticos, a história do chatbot. Mesmo bastante rudimentar, ela imitava conversas humanas com base em instruções e respostas já definidas, e conseguia reconhecer 250 tipos de frases. Mesmo reprovada no Teste de Turing, Eliza caracterizou um avanço significativo e abriu caminho para o que testemunhamos hoje.
Em seguida vieram Parry (1972), Jabberwacky (1988), Dr. Sbaitso (1992), A.L.I.C.E (1995), Smarterchild (2001), Watson (2006), Siri (2010), Google Now (2012), Alexa (2015), Cortana (2015), Bots for Messenger (2016), todos relacionados entre os principais chatbots que surgiram no mercado e dedicados aos mais diversos usos.
O termo “chatbot” foi definido em 1994 pelo cientista da computação Michael Mauldin, fundador da Lycos, Inc., que acabara de desenvolver um protótipo denominado Julia. Ele fez a junção de chatter (pessoa que conversa) com a abreviatura de robot (robô) para descrever robôs materializados como softwares capazes de estabelecer conversação com humanos, na 12ª National Conference on Artificial Intelligence.
Paternidade Alan Turing é considerado atualmente o pai da computação porque suas ideias permitiram o desenvolvimento do que conhecemos como computador. Ele cursou matemática na Universidade de Cambridge, onde obteve graduação com louvor em 1934.
Dois anos depois, ao mesmo tempo em que iniciava estudos que lhe concederam o PhD em matemática e criptografia em Princeton, elaborou uma teoria sobre a construção da máquina de Turing, um modelo teórico que seria capaz de realizar cálculos – utilizado para implementar todos os aspectos lógicos e matemáticos dos computadores construídos mecânica ou eletronicamente. Este foi o seu maior legado, que o transformou em pai da computação. Tanto que os dispositivos eletrônicos modernos são máquinas programáveis operando a partir dos mesmos fundamentos que ele apresentou em 1936, e seguem o caminho aberto pelas velhas calculadoras criadas para realizar cálculos simples.
De volta à Inglaterra em 1938, após sua titulação, foi integrado a uma instituição do governo responsável por quebrar códigos e decifrar enigmas, que teria importância decisiva durante a Segunda Guerra Mundial. Durante o conflito, Turing ingressou numa instituição secreta e elaborou o modelo que serviu de base para a construção da Bombe, máquina que os ingleses utilizaram para decodificar o sistema de criptografia alemão Enigma.
A programação que desenvolveu para o funcionamento da Bombe previa a existência de trechos que se repetiam em grande parte das mensagens, algo que pode ser considerado como elemento de base para os chatbots modernos.
Sua atuação durante a guerra para decifrar o sistema Enigma foi fundamental para diminuir o tempo de duração do conflito, salvar milhões de vidas e ajudar no avanço das tecnologias de computação e criptografia. Devemos a Turing as bases da computação moderna e os primeiros passos para estabelecer a inteligência artificial.
Além de ter construído o alicerce da computação moderna, Turing também desenvolveu os primeiros testes capazes de estabelecer a inteligência artificial. Atualmente o teste de Turing é usado em diversos sites e dispositivos como forma de promover maior segurança para os usuários.