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A bola do Brasil na Itália
- Sylvio Maestrelli
De volta, amigos! Após exatamente um mês passeando pela Itália, curtindo a história, a gastronomia, as belezas naturais e todos os demais encantos da Península. De Nápoles a Turim, passando por Assis, Florença, Roma, região dos lagos, Milão e muitos outros lugares.
Claro que, como fã de futebol, visitei o maravilhoso Museu de San Siro, local onde se veem em fotos, vídeos, troféus e vitrines a grandeza e as glórias do Milan, da Internazionale e da tradicional Azzurra, além de homenagens a alguns deuses do mundo da bola, como Pelé, Maradona e Cruyff. E ainda tive o privilégio de, durante a viagem, viver de perto a enorme festa dos fanáticos napolitanos pela conquista do terceiro Scudetto, com direito a um autêntico Carnaval à brasileira por toda a Bota. Inesquecível!
Passo seguinte ao desembarque em solo pátrio, manchetes estampavam os escândalos das manipulações de resultados nos campeonatos brasileiros. Refleti: antigamente, quem se vendia ou “estava na gaveta” normalmente eram os árbitros e bandeirinhas, mas desde as máfias que conspiravam com as zebras da Loteca, os crimes se sofisticaram, e hoje, no mundo das apostas, até cartão amarelo recebido vale uma grana alta para atletas sem caráter! Buraco sem fundo!
Evidente que me lembrei dos escândalos que contaminaram o futebol italiano. Segundo muitos amigos que tenho por lá, também contribuíram para a queda do nível dos times locais nos últimos anos. Todavia, no Calcio, dirigentes e jogadores foram punidos (alguns, banidos), envolvidos foram presos, times grandes perderam pontos e foram rebaixados, um título nacional da poderosa Juventus foi cassado etc. Tenho dúvida se haverá resposta semelhante no Brasil. Afinal, aqui não é Nápoles, mas nunca falta uma boa pizza, das grandes.
A viagem me reservou um ponto especial, a idolatria que muitos torcedores italianos, principalmente os que acompanham futebol há mais tempo, nutrem pelos craques brasileiros. Sempre tive a curiosidade de saber quem foi realmente ídolo na Itália, já que nossa mídia esportiva, muitas vezes tendenciosa, tem seus “peixes” e distorce informações. Tratei de ouvir os tifosi jornaleiros, taxistas, garçons, atendentes nos hotéis, que carregam o futebol como paixão autêntica.
Depois de muitas consultas e papos, cheguei a alguns nomes. Em primeiro lugar, vem o deus da bola mundial, Pelé, representante máximo da magia do futebol, como descrito no museu de San Siro, onde se vê autografada sua eterna camisa 10 da Seleção Brasileira. Aliás, muitos torcedores milaneses e turinenses reconhecem não só o Rei, mas apontam o time do Santos da primeira metade dos anos 1960 como o melhor da história. Coutinho, Zito, Gilmar, Pepe e outros também são objeto de admiração, uma vez que timaços do Milan, Internazionale, Juventus e muitos mais, vira e mexe, eram derrotados pelos santistas na Europa.
As seleções Canarinho de 1958, 1962 e 1970 são lembradas com carinho e craques como Garrincha, Jairzinho, Tostão, Rivelino, Didi, Gerson, Vavá e mais alguns são mencionados com aplauso e reverência. Afinal, só máquinas como aquelas poderiam derrotar uma geração italiana de gigantes como Sandro Mazzola, Rivera, Gigi Riva, Fachetti, Burgnich, Pratti, Trapattoni, Lodetti e Mora.
Um degrauzinho (muito pequeno) abaixo separa quatro autênticos ícones do Rei Pelé e da geração do tri. E neles estão o rei de Roma e deus da Roma, Falcão, O rei de Florença e da Fiorentina, Julinho Botelho (ambos heróis de Scudettos, craques que levaram suas equipes a patamares superiores e a sensacionais vices nas Champions). O rei das duas equipes de Milão, Ronaldo Fenômeno, que eles acreditam que poderia ser ainda “mais grande” caso as graves contusões não sabotassem sua vitoriosa carreira. Também é reverenciado o super artilheiro Altafini, o nosso Mazzola, campeão pelo Brasil em 1958 e ídolo no Milan (onde foi campeão italiano e europeu), no Napoli e na Juventus. Conversar com torcedores italianos “das antigas” sobre jogadores brasileiros é certeza de ouvir esses nomes quase como unanimidade.
Num patamar um pouco mais abaixo, estão o grande Aldair, que por alguns anos teve sua camisa do Roma aposentada (mais tarde, ele permitiu que seu número 6 fosse novamente utilizado). O goleador Careca, ídolo em Nápoles e considerado o melhor parceiro de Diego Maradona. Kaká, que teve seu auge profissional no Milan. Jair da Costa, o impetuoso ponta-direita, reserva de Garrincha em 1962 na Copa do Chile, que brilhou na Internazionale, onde ganhou duas Champions e dois Mundiais de Clubes, em 1964 e 1965. Toninho Cerezo, que brilhou na Roma e na Sampdoria, de Gênova (estava em campo na campanha vitoriosa do único Scudetto do time e na final de Champions, perdida para o Barcelona. Adriano, o Imperador da Internazionale de Milão – até hoje os interistas não entendem o que aconteceu com a carreira dele. E Zico, que mesmo na pequena Udinese, é citado como um dos melhores estrangeiros que já atuaram na Bota!
Diversos outros nomes são citados, como Júlio César, o excelente zagueiro ex-Guarani que foi campeão de tudo pela Juventus, Chinesinho (Juventus), Júnior (Torino), Dino Sani (Milan), Dino da Costa (Roma), Maicon (Internazionale), Leonardo (Milan), Dida (Milan), o goleiro Júlio César (Internazionale), Dirceu (Napoli), Batista (Lazio), Evair (Atalanta), Sormani (Milan), Amarildo (Milan), Cafu (Roma/Milan), Alemão (Napoli), Edinho (Udinese) e Serginho (Milan).
Também é interessante perceber quem não correspondeu às expectativas ou até mesmo decepcionou, independentemente de ter tido uma grande carreira fora dos gramados italianos. Alex, por exemplo, teve uma passagem confusa pelo Parma, onde não foi praticamente aproveitado. Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho não arrebentaram no Milan, como se esperava. Nem Roberto Carlos na Internazionale. Renato Gaúcho fracassou na Roma e Sócrates não vingou na Fiorentina, ambos considerados profissionais problemáticos. Mas aquele que mais deixou mágoas foi Edmundo, parceiro de Batistuta e Rui Costa na Fiorentina, que abandonou o time na fase decisiva do Italiano de 1998/1999 para cair na folia no Carnaval no Rio de Janeiro, prejudicando a equipe que disputava o título. Até hoje, os torcedores da Viola não perdoam tamanha falta de profissionalismo!
Finalmente, o mais paradoxal: quase ninguém conhece nada dos times sul-americanos, principalmente os mais jovens. Os mais idosos falam do grande Santos de Pelé. E uns poucos, do Flamengo de Zico e do São Paulo de Telê Santana. Só. Grandes esquadrões do continente montados por Palmeiras, Botafogo, Cruzeiro, Boca Juniors, River Plate, Independiente, Nacional, Peñarol são praticamente desconhecidos, solenemente ignorados.
Não me atrevi a perguntar sobre a geração atual de futebolistas brasileiros. Certamente pareceria uma provocação. Afinal, eles assistiram às últimas duas Copas pela televisão e poderiam ficar muito irritados de lembrar que aquelas equipes do Tite estavam na Rússia e no Catar, eles nem isso conseguiram. E sabe como é que é: torcedor italiano é passional e eu não estava no meu campo de jogo, era apenas um “time” visitante.
*Sylvio Maestrelli, educador e apaixonado por futebol