Por Heraldo Palmeira
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21 de novembro de 2024

A bola das meninas 2

Divulgação/FIFA

A bola das meninas 2

  • Heraldo Palmeira e Sylvio Maestrelli

Terminou a fase de grupos da Copa do Mundo Feminina 2023, na Austrália e Nova Zelândia, com um desfecho melancólico para a Seleção Brasileira. Tivemos mais um dissabor futebolístico: a eliminação precoce, depois do tradicional embalo ufanista de boa parte da mídia esportiva do país, ávida por comemorar algum título relevante com as meninas. Não foi desta vez!

Em uma Copa marcada pelo equilíbrio (poucas foram as goleadas), demonstrando um nivelamento cada vez maior entre os países participantes, alguns fatos surpreendentes merecem destaque. A ascensão das equipes africanas – das quatro representantes do continente, três (África do Sul, Marrocos e Nigéria) passaram às oitavas de final. O fracasso de algumas potências do esporte: Canadá, campeão olímpico em 2021; Alemanha, bicampeã mundial e segunda colocada no ranking da FIFA, e China, tradicional no futebol feminino, estão eliminadas. Sem contar que o time número 1 do mundo, os Estados Unidos, suou para empatar com Portugal e se classificar. A França, uma das favoritas, empatou com as semiprofissionais jamaicanas, e a Noruega, embora classificada, foi surpreendida e derrotada pela Nova Zelândia.

Grupo A Suíça e Noruega se classificaram, deu a lógica, embora a expectativa apontava as nórdicas em primeiro lugar, o que não se concretizou.

Grupo B O favorito Canadá decepcionou completamente. Austrália e Nigéria passaram adiante.

Grupo C Japão e Espanha confirmaram o favoritismo – só não se esperava uma goleada das japonesas sobre as espanholas na decisão do grupo, ainda mais porque tiveram apenas 22% de posse de bola durante o jogo.

Grupo D Inglaterra e Dinamarca continuam na Copa, enquanto as chinesas – outa grande decepção –se despediram.

Grupo E Holanda, com excelentes jogadoras, ficou em primeiro e os Estados Unidos, com um futebol muito irregular, passaram de fase.

Grupo F França e Jamaica passaram às oitavas de final, com as Reggae Girlz surgindo como novidade surpreendente depois de despachar o Brasil.

Grupo G Suécia, com seu time muito forte e como era previsto, terminou em primeiro, secundada pela zebra África do Sul.

Grupo H Colômbia, uma seleção emergente, ficou em primeiro jogando bem e “tirando um pouco o pé” na última rodada (já estava classificada). Marrocos, com seu time voluntarioso, ficou com a outra vaga, surgindo como grande zebra.

O “leite derramado” do Brasil tem alguns destaques até o ponto de fervura. A Seleção Brasileira feminina, 8ª no ranking da FIFA, teve como adversárias no grupo a França (4ª no ranking e uma das fortes candidatas ao título), a Jamaica (43ª no ranking e 3ª fora da CONCACAF) e o Panamá (52ª no ranking e 4ª da CONCACAF).

Em teoria era o grupo mais desbalanceado do Mundial, onde ninguém acreditava que francesas e brasileiras deixassem escapar as vagas para as oitavas. Esqueceram da Jamaica, que segurou um empate sofrido com a França (que as sufocou), derrotou as ingênuas panamenhas (1×0) e obteve um novo empate contra nós, em um jogo horroroso – onde a chance mais clara de gol foi perdida pela atacante Shaw! – e se classificou. O time caribenho despachou Pia e suas jogadoras, num vexame completo, só comparável ao das alemãs.

Outro ponto da fervura é a repetição daquele evidente tom de breguice da celebrização ufanista de bobagens que só servem para tirar o foco das celebridades de ocasião. Por pouco mais ou nada, todo mundo recebe o adjetivo “honorífico”, quase substantivo, “guerreiro/guerreira” – essa bobagem é uma das coisas mais maçantes do linguajar corrente. O dano maior é que isso leva à crença de que somos maiorais da superação e o pouco que foi feito já é mais do que suficiente para resolver tudo.

Seria didático lembrar que a seleção jamaicana, classificada para as oitavas de final depois de nos despachar, escreveu uma história impressionante antes mesmo de chegar ao Mundial. As Reggae Girlz, completamente largadas à própria sorte pela federação, resolveram lançar uma vaquinha para custear despesas preparatórias e a viagem da delegação para a Oceania. Diante do vexame público, a entidade conseguiu patrocínio de uma rede de fast food para garantir a segunda participação feminina do país numa Copa. “Queremos garantir o máximo que pudermos para as meninas, que certamente achamos que se sairão muito bem na Copa do Mundo”, discursou Michael Rickett, presidente da JFF, após o acerto.

Para o Brasil restou o massacre da imprensa, pedindo a cabeça da técnica sueca Pia Sundhage e da torcida, que foi tomada de um ufanismo descabido acreditando que teríamos enorme chance de título. Afinal, pelas reportagens, estava sendo criada a imagem de um super time, repleto de jogadoras que tinham histórias de superação na infância e no esporte para chegarem ao Olimpo da bola. Ou seja, jogaram nas costas das atletas uma responsabilidade desmedida. Talvez por isso mesmo, o que se viu no Mundial foi um time tímido, sem nenhuma apresentação convincente, ainda que em vários amistosos anteriores à Copa tenha obtido bons resultados diante de potências do futebol feminino.

Não foi apenas a afobação demonstrada em campo – principalmente contra a Jamaica, quando necessitávamos somente da vitória para a classificação – que causou nosso fracasso. Outros fatores foram importantes: a insistência com Marta (algo semelhante ao que Tite fez com Daniel Alves no Catar), a quem o futebol feminino brasileiro deve muito, embora a jogadora não se apresentou em condições físicas ideais na Copa (vinha de contusão) e foi mal escalada. Como explicar que ela, baixinha, foi enfiada entre zagueiras para tentar cabeçadas em cruzamentos? A falta de alguém “pensante”, que comandasse o nosso meio-campo (problema crônico, que hoje atinge também o futebol masculino). A demora da treinadora para mexer no time, demonstrando uma postura de inércia e passividade no banco. Algumas substituições equivocadas, com diversas jogadoras subaproveitadas.

Se é verdade que as atletas decepcionaram, a comissão técnica teve desempenho ainda pior. Infelizmente, o fracasso de uma vitoriosa técnica estrangeira à frente de nossa Seleção (não nos esqueçamos que Pia já foi bicampeã Olímpica com os Estados Unidos e promoveu uma renovação total no nosso time) dá força à campanha contra técnicos estrangeiros dos xenófobos pachecos de plantão. Com a queda provável de Pia, começam a ser especulados os nomes de Arthur Elias (técnico do Corinthians, que já tem todos os títulos brasileiros possíveis no currículo – 3 Paulistas, 5 Brasileirões, 1 Copa do Brasil e 3 Libertadores) e de Simone Jatobá (ex-jogadora da Seleção Brasileira, hoje dirigindo o Brasil feminino sub-17) para o cargo, já na preparação das Olimpíadas 2024.

Enfim, vivemos mais uma decepção nacional. A nova geração já deve estar se acostumando, parece uma sina dos esportes coletivos brasileiros nos últimos anos. Vôlei, basquete, futsal, futebol, futebol de areia, vôlei de praia, handebol essas modalidades, que já estiveram no topo, estão em baixa há tempos, sem títulos relevantes.

Para quem curte o futebol feminino a Copa não terminou. Todos os continentes estão representados nas oitavas de final. A fase de mata-mata que está começando deverá garantir bons jogos.

Dia 5 (sábado): Suíça x Espanha | Japão x Noruega | Holanda x África do Sul

Dia 6 (domingo): Suécia x Estados Unidos

Dia 7 (segunda-feira): Inglaterra x Nigéria | Austrália x Dinamarca

Dia 8 (terça-feira): Colômbia x Jamaica | França x Marrocos

Os vencedores passarão para a fase seguinte e vão disputar as quartas de final.

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