PublicDomainPictures/Pixabay
Parábolas à parte
- Kalunga Mello Neves
Parábolas à parte, viver é uma arte. Estas palavras me procuraram, coitadinhas, totalmente desencontradas em busca do aconchego de umas com as outras. Eu caminhava pela beira do mar, olhando ora para a areia esparramada em minha frente, ora para a imensidão azul de límpidas águas que o dourado do sol fazia refletir diante de mim. Ao contrário do que inevitavelmente aconteceria tempos atrás, nada de material atraía meu pensamento. Perambulava na companhia de minhas observações e das inseparáveis lembranças, parte mais presente em minha vida nos dias de hoje do que a caipirinha de cachaça que alguém pediu no quiosque ao lado do coqueiro.
Com paciência as junto, as defino, as decifro. Só não as devoro, caro Djavan. Parábolas me fazem lembrar Jesus, o maior contador de histórias que o mundo já teve. Tanto por via impressa, na Bíblia, o livro dos séculos, como por via oral diante de seus fiéis e atentos seguidores que perambulavam por montanhas interessados em sua infinita sabedoria e criatividade. Deu no que deu, mas histórias com final feliz são mais raras e muitas delas encomendadas, o que não é a mesma coisa.
Parábolas à parte, a interpretação que fazemos de tudo que nossos ouvidos são obrigados a ouvir, de tudo que nossos olhos têm que ver ou ler, são histórias que nosso dia a dia transforma para que nossa vida ganhe forma. A arte está implícita em nosso comportamento, em nossas atitudes, em nossa emoção a até em nossa omissão.
Daí que, viver, é uma arte. Temos que nos equilibrar em cordas bambas invisíveis para dividirmos nosso protagonismo com humildade, para valorizarmos nossos momentos de coadjuvantes com orgulho. Temos que saber administrar todos os papéis que nos cabem interpretar, de vilões a mocinhos, de deuses a nós mesmos. E temos, principalmente, que saber que toda glória é efêmera. E que nem tudo é glória, como às vezes imaginamos. Inclusive, a nossa.
*KALUNGA MELLO NEVES, escritor e brincante