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O batuta a mil
- Heraldo Palmeira
GIRAMUNDO OUVIU Sua paciência com as porcarias que bombardeiam os ouvidos o ano inteiro chegou ao limite? Se você tiver voz neste Carnaval para encarar as pessoas da sua convivência que resolveram descer a ladeira para abraçar o mau gosto – inclusive naquelas dancinhas degradantes –, Bicho Maluco Beleza – É Carnaval (link abaixo) é um antídoto poderoso contra a baixaria musical que vem varrendo o país. Arrisque colocar para tocar na sua festa e se divirta jogando confete e serpentina na reação das pessoas.
Arranje um tempinho para agradar seus ouvidos e dê ouvidos ao maluco beleza de São Bento do Una. Sim, ele mesmo, Alceu Valença. O mestre do Carnaval e embaixador da folia pernambucana acaba de lançar Bicho Maluco Beleza – É Carnaval, coletânea de grandes sucessos carnavalescos que propõe uma celebração sem fronteiras com frevos de rua, maracatus, frevos-canções e cirandas.
Para realizar o projeto, Alceu montou um bloco de responsa para fazer a festa: Ivete Sangalo, Maria Bethânia, Juba, Lenine, Elba Ramalho, Almério, Lia de Itamaracá e Geraldo Azevedo. Um jeito poderoso de reinventar o Carnaval fazendo pelo encontro de gerações. Uma explosão de ritmos que sacode as estruturas de qualquer folia tradicional.
O batuta de Olinda está a mil. Aos 77 anos, mantém o frescor intacto e o vigor do seu canto. Um dos únicos artistas que consegue transportar para a frieza de um estúdio o calor daquele meio de rua enlouquecido da maior festa popular do mundo. Os metais em brasa ouvidos no álbum, que botam pra ferver, provam isso, honram a melhor tradição musical que se criou no reinado da folia do Recife Antigo e dos Quatro Cantos de Olinda.
O álbum chega repleto de energia e lirismo. E é o lirismo que torna o Carnaval de Pernambuco um relicário da folia brasileira e mantém suas tradições seculares novinhas em folha. Tanto que a poética do frevo baiano nunca foi páreo, mesmo nos tempos gloriosos de Dodô & Osmar ou nas melhores incursões carnavalescas de Caetano, Gil, Novos Baianos, Moraes Moreira, Gal, Luiz Caldas, Asa de Águia, Chiclete com Banana. Com a decisão de eletrificar tudo, e a chegada das novas gerações de artistas que assumiram o mundo dos trios cada vez mais pasteurizados, houve uma piora sensível na música da grande festa de Salvador. Há quem diga que, quando o afoxé foi reduzido para axé music, se deu a virada de chave para a vulgaridade e o que era cultura popular foi rebaixado a produto massificado para entretenimento de exportação. Algo semelhante ao que ocorreu com a riqueza carnavalesca do Rio, onde o samba de raiz e os blocos lutam bravamente para manter seu terreno no domínio daquela correria com tempo cronometrado transmitida da Sapucaí como sendo “o maior Carnaval do mundo”.
Bicho Maluco Beleza – É Carnaval soa como convite para voltar a sentir o Carnaval como uma profunda expressão artística brasileira. Algo que se transforma em elemento vivo da cultura popular pelo significado na vida dos foliões. A festa que cala fundo porque, na mesma medida que propõe liberar a alma das convenções num clima de alegria desenfreada, carrega a tristeza de que tudo vai se acabar na quarta-feira. Um turbilhão que não passa impune e deixa um rastro de olhares agateados, amores proibidos, explosões, sossegos e saudade, muita saudade. Resta o consolo de que tem mais no próximo ano. Ainda bem.
Ouça aqui
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