Por Heraldo Palmeira
Los Angeles
Nova York
São Paulo
Lisboa
Londres
Fase da Lua
.
.
21 de novembro de 2024

Fim das Copas

Hansuan Fabregas/Pixabay

Fim das Copas

  • Heraldo Palmeira e Sylvio Maestrelli

A Eurocopa e a Copa América terminaram. E agora, José? Pelo que vimos, nem a letra fina de Drummond dá alento.

Mediocridade total. Falta de criatividade. Excesso de maus jogadores, quase todos com postura blasé. Técnicos pouco ousados, muitos vivendo de contra-ataques e saídas com chutões para o alto.

Incapacidade da CONMEBOL – o que não é nenhuma novidade – na organização do torneio, coroada por aquela confusão vergonhosa na final, com direito a pancadaria da polícia norte-americana em torcedores aloprados que resolveram ver o jogo sem comprar ingresso e invadir o estádio. Esta, em suma, é a síntese da Copa América recém terminada nos Estados Unidos, que não vai deixar saudades e ficou com cara de evento a ser repensado ou mesmo dispensável.

Os argentinos ganharam, mas estão longe de convencer. Provavelmente cansados da exaustiva temporada em seus clubes – afinal, ao contrário dos brasileiros, são protagonistas e não coadjuvantes –, se arrastaram fisicamente em campo e mesmo assim conseguiram ser superiores às demais seleções do continente. No canto do cisne de dois símbolos dessa geração vencedora – Di Maria e Otamendi – e de um provável próximo adeus do eterno Messi, os platinos, na base da superação e da predominância do jogo coletivo, mais uma vez ergueram a taça.

Sob o comando de Scaloni, um técnico discreto e ortodoxo que simplesmente procura aproveitar o potencial de cada atleta, desde 2012 os argentinos não jogam um futebol vistoso, mas sucessivamente conquistaram a Copa América em pleno Maracanã, a Copa Finalíssima (contra os italianos), a Copa do Mundo do Catar e, agora, o bicampeonato na Copa América (contra os colombianos). Os hermanos se tornaram nos maiores ganhadores do torneio (16 títulos). De quebra, lideram as Eliminatórias.

É interessante considerar que, em média, 75% de seus atletas participaram de todas essas conquistas, com mudanças quase restritas aos atacantes reservas. Também é bom analisar que algumas das vitórias mais importantes nesse período vieram após disputas de pênaltis (contra Holanda, França, Equador), o que demonstra que, mesmo com o melhor jogador do mundo dos últimos tempos, a seleção argentina não tem uma superioridade flagrante – inclusive lembrando da derrota contra a Arábia Saudita, na estreia da última Copa.

Só que a Argentina tem conjunto, que começa com um excelente goleiro e termina com um banco de reservas onde vários jogadores conseguem revezar com os titulares sem queda abrupta de rendimento da equipe. Os laterais se alternam, Otamendi reforça a zaga num 3-5-2 quando necessário, Paredes e Lo Celso entram com constância previsível no meio-campo, Lautaro Martínez e Álvarez rodiziam.

Há um grupo formado, com senso de coletividade. Até mesmo os menos técnicos atuam em prol do conjunto, não insistem em brilharecos individuais. Solidários, jogam em um sistema tático que privilegia o craque maior. Inteligentes, não disputam espaço com a estrela, mas assumidamente jogam para e por ela. Por isso, vencem, mesmo sem convencer. E com muita garra, basta comparar os jogadores do meio-campo argentino com os nossos: dá vergonha!

Não é à toa que corremos um sério risco de viver, pela primeira vez na História, a inédita experiência de assistir a uma Copa do Mundo sem a presença da Seleção. Ninguém deseja tamanho vexame, mas a realidade é que saímos da Copa América em sexto lugar, atrás de seleções fraquíssimas como a canadense e a venezuelana (ambas provavelmente nem chegariam entre as 24 da fase final da Eurocopa). É um tapa na cara do torcedor.

Nas Eliminatórias a situação confirma esse momento medonho: após seis rodadas, nos encontramos também em sexto lugar, com míseros 7 pontos e comendo poeira de argentinos (15), uruguaios (13), colombianos (12), venezuelanos (9) e equatorianos (8). Por sorte, seis seleções se classificarão diretamente e ainda uma irá para a repescagem. A chance de um fiasco maior diminui bastante, mas não estamos a salvo. E a sorte tende a desaparecer, caso a Amarelinha chegue à próxima Copa com essa cara de circo mambembe que está no picadeiro há anos. Não é por menos que muita gente até acha melhor mesmo não ir fazer turismo na América do Norte em 2026 e voltar humilhada.

Pelo que vimos na Eurocopa, a grande maioria das seleções é bastante superior às equipes sul-americanas, obviamente a nossa incluída.

Tudo certo, não se viu nenhum jogador fora de série no torneio do Velho Continente, mas é bom acompanhar os jovens promissores que entraram em campo por Espanha, França, Inglaterra, Portugal, Holanda, que gradativamente vêm sendo bem aproveitados por técnicos estudiosos, que não desenvolvem seus trabalhos enrolados em bandeiras motivacionais e ladainhas de autoajuda. A campeã Espanha manda um recado importante: seu agora técnico principal De La Fuente, dirigiu diversas categorias de base da Fúria, obtendo vários títulos. Conhece profundamente seus atletas e faz com que produzam mais.

Do outro lado do Atlântico, o que vimos de novidade na Copa América? Nada. Bielsa, com carência de bons defensores, tentou utilizar uma compactação com jogadores multiuso em seu meio-campo. Mas não se faz limonada sem limão e, a rigor, apenas Ugarte e Valverde se destacaram. Na frente, o badalado Darwin Núñez lembrava mais o gaúcho Flávio Minuano (que perdia gols em pencas, muitas vezes na cara do goleiro) do que o fantástico Luisito Suárez, a quem substituiu – ver o velho artilheiro sair do banco e vencer suas limitações físicas conhecidas para incendiar a Celeste foi impressionante.

A Colômbia tentou fazer de James Rodríguez o seu Messi, montando um esquema onde teve total liberdade e os companheiros jogaram para ele. Funcionou apenas nos jogos contra equipes sem meio-campo (como o Brasil). Quando a dificuldade aumentou, vimos apenas toques laterais do “craque”, encaixotado, sem saber sair de marcações. Entre os cafeteros, talvez o mais lúcido tenha sido o palmeirense Richard Rios, e restou a decepção com o badalado ponteiro Luis Díaz, do Liverpool.

As demais seleções, incluindo a Amarelinha, foram meras espectadoras. Aplausos ao Canadá, time que vem crescendo e se superou, e à Venezuela, que mesmo limitada venceu três jogos. E as maiores vaias devem ir para esse catado de peladeiros que representou o Brasil de forma bizarra e grotesca, embora mexicanos e norte-americanos tenham fracassado também.

Nosso papel foi digno de esquecimento, pois não parecemos interessados em escapar do ridículo. Começamos reclamando das dimensões dos campos de jogo, como se o problema não fosse comum a todas as seleções. Conseguimos empatar com a bisonha Costa Rica. Choramos por um pênalti contra os colombianos, sem lembrar que pouco antes eles tiveram um gol anulado injustamente por suposto impedimento. Corremos como galinhas batendo asas para bater os pênaltis contra o Uruguai, uma imagem que merecidamente virou meme nas redes. Levamos jogador investigado por escândalos em apostas, com chances elevadas de condenação – e que não fez qualquer diferença em campo. Vimos o simpático e fraco Dorival Júnior – com uniforme copiado do Zagallo, infeliz homenagem – ser excluído da rodinha onde foram escolhidos os cobradores dos pênaltis. Ficamos pês da vida com Vinicius Júnior tomando cartão para não levar um chapéu no campo de ataque, suficiente para ficar de fora da semifinal.

Em que pese estar vivendo uma ótima fase no Real Madrid, Vinicius deveria olhar para Lionel Messi, um dos maiorais de todos os tempos: nunca deu um drible desnecessário – embora tenha técnica para humilhar quem cruzar seu caminho – , joga sem chegar muito perto de marcadores e passa longe de encrencas com adversários.

Para finalizar a ópera-bufa, Endrick foi às falas para reclamar das críticas e lembrar que os colegas que jogam na Europa poderiam estar gozando férias, como se jogar na Seleção fosse um favor – se alguém não der um puxão de orelha nesse garoto, ele poderá virar um novo Lukaku, ainda mais com a chegada de Mbappé ao Real. Como cravou na mosca o jornalista Joaquim Ferreira dos Santos, esse garoto precisa entender que “é preciso menos gola e mais bola”. Que inveja da campeã Espanha, cujo “menino” Lamine Yamal tem apenas 17 anos, joga um bolão todos os jogos e sequer lembra que tem gola na camisa para levantar.

Correndo por fora no nosso circo de horrores, a pachecada midiática já se desmancha que Neymar – que zanzou pelo ambiente interno da delegação e se exibiu nos telões dos estádios – pode ser a solução. Já não basta tudo que vimos?

Como o presidente da CBF já disse que nada mudará, os torcedores esgotados talvez tenham que mudar. De canal, de esporte, de seleção para torcer. Afinal, parece que o único sinal de mudança é o retorno de velhos conhecidos que, milionários e no ocaso da carreira, perceberam que nesta terra de ninguém futebolística podem até voltar a ser convocados. Thiago Silva e Marcelo estão no Fluminense. David Luiz no Flamengo. Philippe Coutinho no Vasco. Felipe Anderson no Palmeiras. Oscar deve sair da China para Flamengo ou Internacional. Casemiro já não brilha na Europa e há sondagens de times brasileiros por ele. Sinceramente? Sei não! Só falta mesmo dona Lúcia mandar uma nova carta passando pano…

©