Flávio Rezende
As cores do mundo
- Flávio Rezende
Enxergar que o mundo tem tudo em todo canto é um escrito da alma.
Tenho tido a oportunidade de me locomover pelo planet em razão de situações que favorecem esses movimentos diversos. Além da satisfação pessoal de estar inserido num patamar OK à essa maravilhosa oportunidade de vida, percebo nestas idas e vindas para lá e para cá o quanto o planet está realmente globalizado, com as distâncias encurtadas e as ofertas de comidas, visuais, pensamentos, artes e músicas – para não falar de milhares de outras coisas – disponíveis em todos os cantos e recantos.
Estava agora mesmo num barzinho simples de Ponta Negra e o músico executou sons de Nova Orleans. No cardápio, tira-gostos que vão dos tacos mexicanos às salsichas alemãs. É assim, aonde vou tem de tudo: samba nos Estados Unidos, rock em Ceará-Mirim, blues em São Miguel do Gostoso e forró em Düsseldorf. Em Nova York, onde passei temporada recente, também tem de tudo: Chinatown, Little Italy, Brasil. Tem artes de todos os países e rangos igualmente multinacionais.
Roupas? Nem se fala! Agora mesmo, já no Sempre Rock, em Ponta Negra, vejo uma jovem dark, um coroa da minha geração no melhor estilo Woodstock, além das saias, calças rasgadas e camisetas de engajamentos diversos. Assim é no mundo todo. Comunistas com logomarcas da Nike e Apple; capitalistas com camisetas de Guevara. Esotéricos com batas indianas, torcedores com camisetas de times de todos os países – pouco importa se algum dia suas nações se enfrentaram em guerras insanas – nos quatro cantos da bola azul chamada Terra.
Ter essa miscelânea é ruim, é bom? Acho ótimo, e digo: nos próximos decênios veremos mais moídos, pois portais de universos paralelos estarão abertos e essa singularidade democrática, já em vigor entre nós, será abastecida com mais estes colaboradores extras.
Sabe aqueles filmes chamados de ficção científica, onde aparecem esquisitices de seres de todos os tipos, roupas, comidas, mobilidade e visuais radicalmente diferentes do que estamos acostumados? Tudo isso está em curso. Se você prestar bem atenção, os sinais já vão mostrando esse caminho impossível de ignorar.
Estando em Nova York pude já antever um pouco deste futuro quase presente, as novas cores do mundo: seres altamente diferentes, comidas de todos os tipos, comportamentos plurais e, o melhor, as pessoas convivendo com isso de maneira absolutamente natural.
Mas a grande revolução que teremos no futuro próximo vai mexer nas almas. Sabe aquela história do Deus bonzinho, da submissão religiosa, da devoção solicitada por todos os ícones religiosos? Balela, isso é na verdade a big fraude. Afinal, que bondade é essa quando bombas matam crianças, todo tipo de gente ruim tem projeção e apoio e, apesar de o Homo sapiens crer nesse pseudocomandante do bem por milênios, desgraças e tantos tipos de mal parecem vencer sempre? Quem já não ouviu que tudo isso é para testar nossa fé? Permanece atual o sucesso popular dos Paralamas: “A arte de viver da fé, só não se sabe fé em quê”.
Já disseram que “a religião é o ópio do povo”, e isso só se comprova junto à ladainha de que devemos prestar devoção a um monte de divindades, que, na verdade, nunca resolveram nada, só nos pedem obediência cega enquanto o planeta e nós convivemos diariamente com mortes, crimes, impunidade, injustiças, guerras, corrupção…
O mundo parece firmemente estabelecido, tem tudo em todo canto, mas, ainda bem, nada nunca é definitivo. Não foram poucas as rupturas e estamos diante de mais uma, das mais profundas. Ou a gente evolui para a pluralidade de uma cultura múltipla e planetária que nos permita encontrar boas soluções para nossos problemas, ou seremos eternamente enganados por bondades não sacramentadas e profecias e revelações nunca realizadas. Precisamos deixar de louvar quem, na verdade, nunca resolveu nada, e cuidar de ver as coisas como elas realmente são. Talvez venha daí a dificuldade que tanta gente tem enfrentado para assimilar o que está acontecendo. A bad news é que não dá mais para ficar olhando de longe.
Que situação… Assim são as coisas como elas são. É assim que lido com essas coisas. Luz!
*FLÁVIO REZENDE, fotógrafo da vida