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Cerveja em pó
- Heraldo Palmeira
Sabe aquela lourinha estupidamente gelada que estala na língua, patrimônio da humanidade há milênios? Pois bem, nesse mundo que adora novidades e onde disrupção é palavrinha da moda, uma cervejaria alemã está anunciando algo inusitado: a cerveja em pó, que deverá chegar ao mercado até o fim de 2023 sob o nome comercial de Dryest Beer.
É importante saber que a inovação não é coisa de novatos: a fabricante é a Neuzeller Kloster Brewery, uma das mais antigas cervejarias da Alemanha. A lógica dos seus criadores é que a bebida vai revolucionar a indústria e terá impacto positivo no meio ambiente porque bastará adicionar água ao pó. Assim, diminuirá a necessidade de garrafas, engradados e barris, sem contar a otimização dos espaços de carga, transporte e armazenamento. “Inventamos um produto completamente novo. Pó de cerveja como este é o primeiro no mundo. Calculamos que, em relação à Alemanha, será possível economizar cerca de 3 a 5 por cento das emissões de CO2. E se você olhar para isso em todo o mundo, é uma soma gigantesca”, anuncia Stefan Fritsche, que comanda a empresa.
Por enquanto, a única opção disponível não contém álcool, embora a fabricante garanta que a versão que embriaga não vai demorar a chegar. Nas sessões de degustação o novo produto saiu-se muito bem, pois manteve autenticidade de sabor e espuma, além das opções clara e escura. O novo produto pode trazer um novo tempo para uma indústria tradicional, que não se caracteriza por grandes mudanças.
Navegando contra essa corrente conservadora, a Neuzeller também é conhecida por apresentar inovações ao mercado sempre respeitando a tradição na hora de conectá-la ao futuro. E aproveitou o momento para anunciar que mais de 40 bebidas estão em processo de invenção.
O próximo passo da cerveja em pó não é algo simples: conquistar a simpatia dos bebedores “profissionais” de cerveja, uma gente que não deverá abrir mão facilmente dos rituais consagrados para estalar a língua entre garrafas.
É certo que convivemos há anos com bebidas solúveis. Leite, café e sucos instantâneos já estão em nossas despensas desde sempre. Claro, há ressalvas principalmente dos paladares mais apurados. Sem contar os ritualistas que sempre torcem a cara para as disrupções. Como desprezar a tradição histórica de ver o leite transbordar sobre o fogão no exato momento do menor descuido? É fácil dispensar o cheiro do café sendo coado tomando conta do ambiente? E o som do espremedor vertendo ali o suco da laranja, ou do liquidificador misturando frutas ao leite gelado para gerar aquela vitamina de lamber os beiços?
História Muitos historiadores não acreditam na invenção da cerveja, ela simplesmente foi descoberta quando o homem deixou a vida nômade, se estabeleceu em lugares, criou os primeiros campos de agricultura de cereais – cevada e trigo – e passou a estocar grãos ali por 9000 a.C. com a dificuldade de consumir alguns deles in natura, a água ajudava a amaciar e transformar em pasta. O malte surgiu assim e seu tom adocicado passou a compor receitas. A fermentação veio pouco depois, quando a umidade agiu em grãos armazenados. Alguém deu asas à curiosidade, juntou tudo isso e o resultado é conhecido.
Muito tempo depois (4000 a.C.), os sumérios fizeram o primeiro registro conhecido da produção da bebida. Eram verdadeiros mestres cervejeiros, fabricavam mais de 20 tipos. Os egípcios incluíram a maravilha em sua dieta diária e os romanos foram os grandes garotos-propaganda, espalhando-a pelo mundo – Júlio César era grande apreciador e atribui-se a ele a introdução da bebida entre britânicos e gauleses.
E foi na Gália – território que abrangia a França atual, mais Bélgica, Suíça e partes da Alemanha e Itália – que a bebida ganhou seu nome “cerevisia” ou “cervisia”, em homenagem a Ceres, deusa da agricultura e da fertilidade. A partir do século I d.C., a bebida produzida pelos ancestrais de alemães e franceses chegou a outros pontos da Europa, ganhando grande popularidade entre belgas, ingleses, irlandeses e holandeses.
A habilidade dos religiosos na produção de iguarias para o paladar também marcou presença na história da cerveja. Tanto que a cervejaria mais antiga do mundo ainda em funcionamento está instalada no Mosteiro Beneditino Weihenstephan, na Bavária. Fundado por São Corbiniano em 725, hoje é importante centro de formação de mestres cervejeiros e centro de produção das cervejas Weihenstephaner. Saúde!
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