Divulgação/Apple Corps
Cinema 1 por 4
- Heraldo Palmeira
Quando uma manifestação artística se mostra muito acima do comum, segue perene e até gerando filhotes que nunca foram programados. Algo como geração espontânea mesmo. É isso que ocorre com os Beatles, apesar de uma carreira curta (1962-1970), a metade dela sem fazer apresentações ao vivo, e dos 54 anos passados desde o fim da banda.
O interesse pela maior banda de todos os tempos segue inesgotável e 18 cinebiografias já foram produzidas para cinema e televisão. Agora, o novo filhote Beatle está prometido para 2027 a partir de uma associação da Sony Pictures Entertainment e o premiado diretor e produtor de cinema britânico Sam Mendes, dono de uma vasta obra que inclui Beleza Americana, Estrada para Perdição, Soldado Anônimo, 1917, Império da Luz e até James Bond (007 Operação Skyfall e 007 Contra Spectre).
Na verdade, a promessa é de que teremos um filhote bem grande subdividido em quatro filmes, que deverão ser lançados simultaneamente e valerão por um. A missão do cineasta será mergulhar com total liberdade nas histórias individuais de John, Paul, George e Ringo para contar a história dos Beatles a partir da vida de cada um deles e dos seus pontos de vista pessoais a respeito de tudo que aconteceu.
Segundo o jornal britânico The Guardian, Mendes terá liberdade absoluta para desenvolver os roteiros da forma que julgar mais adequada, e os quatro longas serão lançados simultaneamente. “A cadência dos filmes será inovadora e pioneira […] Estou honrado por contar a história da maior banda de rock de todos os tempos e animado por desafiar a noção do que constitui uma ida ao cinema”, afirmou o diretor, que também vai assinar a produção junto com Pippa Harris e Julie Pastor, suas sócias na produtora Neal Street Productions. Jeff Jones será o produtor executivo representente da Apple Corps. Por enquanto, nada foi anunciado a respeito do elenco.
Esta é a primeira vez que Paul McCartney, Ringo Starr e as famílias de John Lennon e George Harrison dão autorização para que a história e as músicas da banda sejam adaptadas para o cinema num projeto não conduzido por suas próprias empresas. “Esse projeto nasce de uma ideia que Sam teve há um ano, e é um testamento de seu brilhantismo criativo e poder de persuasão para que Paul McCartney, Ringo Starr, Sean Lennon e Olivia Harrison respondessem de forma tão afetuosa e empolgada assim que ele os abordou”, festejou Pippa Harris sobre o início das negociações.
O entusiasmo da Sony Pictures não é diferente. “Os eventos cinematográficos de hoje devem ser culturalmente sísmicos. A ideia ousada e em grande escala de Sam é isso e muito mais. Unir sua equipe de cineastas à estreia na música e às histórias de quatro jovens que mudaram o mundo irá agitar o público em todo o mundo. Estamos profundamente gratos a todas as partes e esperamos quebrar algumas regras com a visão artística única de Sam”, declarou o CEO da empresa Tom Rothman.
Esses quatro jovens que ganharão cinebiografias interconectadas eram apenas rapazotes interioranos que explodiram na onda rasa de um estilo musical com substância suficiente para durar alguns verões, enfeitado pela expressão-chiclete yeah, yeah, yeah.
Ainda bem que eles deram uma guinada radical na metade da carreira e no auge do sucesso. Se o álbum Rubber Soul (1965) já mostrava alguns sinais de que algo grande estava a caminho, o ano de 1966 foi considerado revolucionário na história dos Fab Four. E trouxe a revelação dividida em duas partes.
A primeira, a corajosa decisão de abandonar definitivamente os palcos. Eles estavam saturados de lotar estádios onde não conseguiam se ouvir – os equipamentos eram precários e as plateias enlouquecidas não paravam de gritar. Assim, suspenderam as apresentações ao vivo depois do show no Candlestick Park em San Francisco (EUA), no dia 29 de agosto daquele ano. Depois disso, a única vez que tocaram juntos fora dos estúdios foi em 30 de janeiro de 1969. Nada mais do que cinco músicas no terraço da Apple Corps (Londres) para alguns amigos e a equipe de produção encarregada de gravar o momento agora histórico.
A segunda, o lançamento do álbum Revolver (link abaixo), único produzido naquele 1966. O som da banda havia mudado completamente, era outro, muito melhor. Estava iniciada a passagem daquela espuma juvenil que se dissolvia com o vento para um mergulho definitivo nas águas da arte profunda. É indiscutível que os Beatles de dezembro de 1966 pouco tinham a ver com os Beatles de janeiro de 1966.
Os quatro rapazes de Liverpool iniciaram seu no novo tempo dedicados a compor, aprimorar a condição de instrumentistas, explorar intensamente novas tecnologias de estúdio e desenvolver técnicas inovadoras de gravação. Era a entrada no psicodelismo, a soleira das obras-primas Sgt. Pepper’s, White Album e Abbey Road que deslumbrariam o mundo logo em seguida.
Ouça aqui
Revolver https://open.spotify.com/intl-pt/album/3PRoXYsngSwjEQWR5PsHWR?si=WjB4jOt7RR6WyX1VOlDdvA