
Divulgação/Paramount
Filme de tribunal
- Nelson Marques
GIRAMUNDO VIU The Caine Mutiny Court-Martial (2023) estreou no Festival de Veneza e seguiu direto para o streaming, sem passar nas telonas. E não fosse a presença de William Friedkin, diretor e roteirista (junto com Herman Wouk, autor do livro homônimo), poderia passar despercebido. Está disponível no canal Paramount+ e Netflix. O filme é um drama judicial, inclusive com uma história conhecida e já vista, filmada anteriormente com o título A Nave da Revolta por Edward Dimitry (1954) e versões para TV por Tony Doogood (1959) e Robert Altman (1988).
The Caine Mutiny Court-Martial é um projeto do grande diretor William Friedkin (O Exorcista, Operação França) em seu último trabalho, numa despedida que deixará saudades pois o cineasta morreu no fim de 2023. Foi um ano difícil para ele, pois logo após terminar a filmagem, Lance Reddick, seu amigo e que tem um papel marcante na trama, também faleceu, e por isso a primeira tela dos créditos é dedicada a ele. Por coincidência, de certo modo, o filme fala de perdas e da finitude da vida.
Em termos de estilo, esse drama de guerra é muito simples e conta a história de um oficial da Marinha enfrentando julgamento por motim após tomar o comando de um navio cujo capitão que ele considerou estar agindo de forma instável. A história é contada com dois cenários, meia dúzia de atores e grandes seções de diálogo. A produção realça o poder de combinar uma boa interpretação com um bom texto. Mais ainda, como um mestre do cinema pode trabalhar de forma competente com cortes e diferentes planos, conquistando a atenção quase de forma magnética.
A produção contou com um diretor auxiliar do porte de Guillermo del Toro, além do trabalho de qualidade dos atores Lance Reddick, Jason Clarke, Jake Lacy, Monica Raymund, Lewis Pullman e Kiefer Sutherland.
O cinema tem como característica formar público cativo para artistas e gêneros. Filmes de tribunal – assim como dramas e comédias – estão nesse caso e exemplos não faltam: Sidney Lumet com Henry Fonda e todo o elenco em 12 homens e uma Sentença (1957). Billy Wilder com Tyrone Power e Marlene Dietrich em Testemunha de Acusação (1957). Sidney Lumet com Paul Newman em O Veredicto (1982). Rob Reiner com Tom Cruise e Jack Nicholson em Questão de Honra (1992). Clint Eastwood com Nicholas Hoult em Jurado Nº 2 (2024).
Parece que o ambiente de um tribunal de júri, alguns deles contando só com as quatro paredes da sala de julgamento, bem como a excelência na construção de uma imagem (a favor ou contra) fazem a diferença no veredito e no sucesso da história.
The Caine Mutiny Court-Martial pode ser apenas mais um filme de tribunal, mas tem a virtude de abordar em paralelo um tema tão comum nos dias de hoje: o adoecimento mental e o que ele pode acarretar quando as pessoas e instituições insistem em ignorá-lo.