Por Heraldo Palmeira
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2 de abril de 2025

KALUNGA MELLO NEVES Menos é mais

Geralt/Gerd Altmann/Pixabay

Menos é mais

  • Kalunga Mello Neves

Queria que fosse menos a cobrança, subjetiva também, sobre minhas atitudes e opiniões. A subjetividade, no meu caso, não esconde covardemente um medo de desagradar quem me policia com sua censura. Me confundo e não sei se opino para ser gostado ou para transgredir e fazer coro aos insatisfeitos com a satisfação alheia.

Está muito complexo ser o que se é. A espontaneidade inibiu-se diante de tantas exigências contestáveis, impostas em forma de lei, criadas a toque de caixa por figuras tão tendenciosas quanto nós. Muito do que podia antes agora não pode mais. E, se pode, continua sendo benesse exclusiva de alguns. Se me achou confuso, é normal. Quem não está confuso hoje em dia?

Voltemos no tempo. Fui criado em meio a uma diversidade total nos anos sessenta. Em minha turma de escola, e entre meus colegas de infância e adolescência, tinha gordas e lindas, magras e feias, filhos de fazendeiros e filhos de serventes de pedreiro, negros e brancos. Filhos de militar, então eram inúmeros. Quem nos corrigia, quem nos censurava, quem nos orientava para respeitar os mais velhos, as professoras, as meninas, os policiais, eram nossos pais. A gente, vez em quando, se revoltava, sim. Nos sentíamos prejudicados, inconformados, rejeitados e isso nos levava a reclamar, a sermos até exagerados em nossa maneira de exigir nossos direitos. Às vezes adiantava, às vezes um castigo pela nossa audácia era a consequência do nosso ato de rebeldia. A gente sabia que era assim e respeitava as decisões, nos favorecessem ou não.

Hoje, aquela diversidade que, por si mesma, estabelecia seus limites não existe mais. Ah, em tempo: sempre gostei de frases de efeito como “temos que respeitar, para sermos respeitados”, “brincar sem ofender, esta é a nossa regra”, “triste também é ver o oprimido se tornar opressor” (esta eu não entendia muito bem na época; agora anda bem fácil compreender).

Em resumo, queria mesmo é que tudo em minha volta fosse menos patrulhado ideologicamente, para que a naturalidade voltasse a reinar em nosso dia a dia. Seria melhor para todos, eu acho. Até porque não cansamos de dizer, e já de forma sentida: menos é mais!

*KALUNGA MELLO NEVES, escritor e brincante

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