Ilustração: Azmi Talib/Pixabay
- Heraldo Palmeira
Metaverso, metaverso, metaverso… Como acontece de tempos em tempos, algo novo surge no horizonte público e passa a ser ouvido em todos os lugares. É o assunto da hora, todo mundo faz questão de parecer inteirado, uma espécie de chavão da moda daqueles que caem como uma luva na língua dos escritórios descolados, vira estratégia corporativa. Falar daquilo é estar absolutamente up-to-date, mesmo que a maioria não faça a menor ideia do que realmente se trata. Não faz mal, os interlocutores também não. Até porque o metaverso pode não exatamente o que as pessoas estão pensando.
O conceito de metaverso, sem que houvesse qualquer ideia desse nome, está pairando por aí há décadas e a literatura a respeito dele tem os primeiros registros na década de 1930. Sim, a atual “modernidade” foi visualizada há quase cem anos. É muito comum que os traços iniciais de futuras soluções sejam rascunhados e acordados num tempo em ainda não esteja disponível a capacidade técnica para sua produção. O que parece ficção científica hoje sempre tem raízes antigas.
Em 1945, o engenheiro norte-americano Vannevar Bush estava intensamente envolvido com o desenvolvimento da bomba atômica e trouxe à luz a ideia do memex – aglutinação de memória + index –, baseada no funcionamento da mente humana operando sempre por associações. Ele imaginou e descreveu um dispositivo que pudesse guardar informações e permitir acesso rápido a elas, estabelecendo as bases do conceito de hipertexto, que seria o alicerce da world wide web, o simpático www que “significa” internet, cujo desenvolvimento ocorreu duas décadas depois.
Na verdade, essa “coisa” que está em todas as rodas moderninhas surgiu e ganhou nome no livro Snow Crash, do escritor norte-americano Neal Stephenson, publicado em 1992. No texto, há um mundo virtual 3D denominado metaverso, habitado por avatares de pessoas que têm interação com experiências diversas. Foi ele quem primeiro descreveu e cunhou os termos “Metaverso” e “Avatar” e apresentou as principais ideias a respeito. O autor utilizou as palavras “meta” (pode ser traduzida do inglês como “mais abrangente”) e “universe” (universo) para chegar a metaverso.
O atual boom teve sua base na criação não estruturada dos videogames, com os primeiros passos em 1999, quando foi criada uma funcionalidade no estilo metaverso na primeira versão do Unreal Tournament, lançado pela Epic Games. Na sequência, vieram o Second Life (Linden Lab, 2003) e Fortnite (Epic Games, 2011), com um avanço impressionante de usuários engajados. Segundo o norte-americano Matthew Ball, ex-executivo do Amazon Studios e uma das maiores autoridades no assunto, “Esse comportamento de socialização e criação não estruturada – ao invés de jogar um jogo – passou de marginal e incidental para central nas experiências”.
O Second Life – espaço virtual que oferecia a experiência de uma segunda vida onde era possível viver novas experiências – chegou com tanta força ao mercado que algumas marcas famosas chegaram a criar lojas virtuais inseridas em seu mundo. Apesar da repercussão midiática inicial, o projeto perdeu força e hoje está resumido a um pequeno nicho de entusiastas.
O próprio Ball tem sua definição: “O metaverso é uma rede massivamente dimensionada, permanente e interoperável de mundos virtuais 3D renderizados em tempo real e simulações que suportam a continuidade de identidade, objetos, história, pagamentos e direitos, que podem ser experimentados de forma síncrona e persistente por um número efetivamente ilimitado de usuários, cada um com um senso de presença individual”.
Embora o metaverso esteja presente em diversas produções da televisão e do cinema, pode ser que ele fique abaixo das visões fantásticas criadas pelos roteiristas. Talvez se resuma a uma nova e espetacular plataforma computacional ou meio de disseminação de conteúdo. Também há quem acredite que esses mundos virtuais “habitáveis” além do mundo físico é o chamado metaverso e há quem acredite que será a nova versão da internet.
Talvez esse segundo grupo de pensamento retire pistas daquele 28 de outubro de 2021 em que Mark Zuckerberg trocou o nome do seu conglomerado empresarial para Meta, como que indicando sua nova aposta: desenvolver plataformas de realidade virtual que permitirão simular presença, realizar reuniões e vivenciar experiências – como que um “habite-se” aos mundos paralelos da Epic Games e Linden Lab.
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