Divulgação/The Macallan
Uísque milionário
- Heraldo Palmeira
O anúncio de que uma garrafa do uísque The Macallan Valerio Adami 1926 irá a leilão elevou o teor alcoólico dos apaixonados por um bom escocês, ainda mais quando se trata da marca considerada por muitos especialistas como a melhor de todas.
Para começar a conversa com o leiloeiro da Sotheby’s de Londres que conduzirá o evento marcado para 18 de novembro, o distinto interessado deverá forrar o bolso com uma quantia a partir de £ 750 mil (R$ 4,52 milhões), mas deve ter a mente aberta para gastar bem mais porque a última garrafa do mesmo barril alcançou £ 1,5 milhão (R$ 9,04 milhões) num leilão realizado em 2019.
Sim, esse uísque é mesmo uma preciosidade. Destilado em 1926 em seu famoso barril, envelheceu 60 anos e terminou envasado em apenas 40 garrafas em 1986. Nenhuma delas foi comercializada, a destilaria resolveu destinar algumas somente aos principais clientes.
As 40 garrafas icônicas foram personalizadas de forma especial. Duas ficaram sem rótulo nenhum – uma delas pintada pelo artista irlandês Michael Dillon. O Fire & Rare foi colocado em 14 unidades – caso do exemplar leiloado em 2019. Outras 12 foram rotuladas pelo artista pop britânico Peter Blake, cabendo ao pintor italiano Valerio Adami as 12 restantes.
Não se sabe quantas garrafas ainda existem da série rotulada por Adami. Especula-se que uma foi destruída durante um terremoto ocorrido no Japão em 2011, e outra, aberta e consumida. Assim, restariam somente dez garrafas dessa série, uma delas a que vai ser leiloada agora.
História de valor A destilaria The Macallan foi fundada por Alexander Reid em 1824 e, desde então, utiliza as melhores matérias-primas para produzir uma variedade de bebidas. Mesmo mantendo métodos seculares de produção que lhe garantem a posição de referência maior no mercado de uísque, inaugurou há poucos anos uma das mais modernas destilarias do mundo. O empreendimento custou £ 500 milhões (R$ 3,01 bilhões), opera com tecnologia de ponta em um prédio – assinado pelo renomado escritório Roger Stirk Harbour & Partners – que une elementos da arquitetura tradicional das terras escocesas e linhas futuristas, e já virou atração turística disputada.
The Macallan produz o uísque mais cobiçado do mundo, recordista de prêmios, e todos os seus rótulos são de altíssima qualidade. É um single malt (feito de malte único) gerado por um processo repleto de particularidades e safras muito limitadas. Por isso é preciso preparar o bolso para encarar mesmo as versões mais simples e não adianta ter ilusões, prevalece o princípio de que o que é bom custa caro. É o que se pode chamar de “ouro líquido”, usando a linguagem do britânico Jim Murray, considerado a maior autoridade em uísque do planeta.
O alto preço tem origem em fatores como a madeira usada no armazenamento da bebida e quantidade envasada. Afinal, é a única destilaria que fabrica os próprios barris e apenas 16% de tudo que é produzido chega ao consumidor final. “Nenhuma outra destilaria do mundo faz os próprios barris, apenas a The Macallan. São usadas madeiras de carvalho com mais de 100 anos de idade, que dão mais aroma e sabor à bebida. E nem tudo do que é destilado vai ao mercado. A gente só usa o ‘coração’ da bebida, descartando o começo e o final da produção do alambique, enquanto a média do mercado é de 40%”, explica Gianpaolo Morselli, embaixador da marca no Brasil.
Ele retoma a questão dos barris especiais para explicar o grau de exclusividade. “Tem também os barris específicos, como os feitos com madeiras de árvores de 150 anos que deixam a bebida ainda mais complexa. Temos um especialista que analisa os barris e escolhe os ideais para a produção de bebidas excepcionais […] Via de regra, se você tiver duas madeiras iguais usadas em um barril grande e em um pequeno, o menor vai ter um sabor muito mais rico e complexo. É o caso do Rare Cask, com barris raros e com menor quantidade disponível”, revela.
Morselli também arrisca o prognóstico de que, em razão de tamanho refinamento no processo produtivo, a ressaca de uma garrafa inteira de The Macallan é muito menor do que a dos concorrentes.
Estratégia de cinema Ao longo do tempo a destilaria vem usando o cinema para reforçar a imagem dos seus produtos. O costume consagrado dos caubóis do faroeste tomarem uísque puro e num gole único ganhou ares de lenda com Clint Eastwood convenientemente ao lado de um rótulo do clássico The Macallan.
Noutra frente muito mais elegante, um certo James Bond, o agente 007 a serviço de sua majestade e com licença para matar, sempre fez questão de deixar claro que The Macallan era seu uísque preferido.
Impossível ser mais preciso ao se valer de uma estratégia de marketing conceitual porque, mesmo que seu público de interesse passe longe de sessões populares em salas de cinema, estar associado a personagens consagrados conquista de forma subliminar até mesmo quem jamais consumirá o produto – como ocorre com os supercarros esportivos, grifes de moda e relógios de alto luxo.